segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Perda Gestacional Repetida ou o Síndrome do Serial Killer

"Hum?" Devem estar a pensar. Como é que perder um bébé é comparável a matar psicoticamente?
Pois não pode ser comparável e não deve sê-lo. Mas é.
Quem sofre de abortos repetidos sem explicação (ou sem a conhecer), pode - a certa altura - pensar mesmo que está a matar os seus bébés. Alguém que ainda não conhece, e que não lhe fez mal algum. Mas esperemos que a pobre mãe que os sofreu não pense isso muito tempo porque não é de todo assim e não lhe faz nada bem pensá-lo.
Comparo as duas coisas pela reacção das pessoas.

Vejamos o contexto de uma mãe: à sua volta tem profissionais da saúde, amigos, família. De todos estes, raros são os que lhe oferecem ajuda aquando de uma perda gestacional (há sempre os que oferecem mas na realidade depois "não se apresentam ao serviço") e mais são os que se afastam "para dar espaço". Dos que oferecem ajuda e realmente comparecem, há sempre alguns que "têm que ensinar" algo. Não me levem a mal, é a forma com que sabem ou pensam que sabem ajudar. E em vez de estarem com, são. Em vez de ouvirem, falam.


Porque o silêncio é desconfortável.
Porque o silêncio é melhor quando não se está junto. (Por isso tantos não conseguem aparecer).
Embora haja alguma "ajuda", no tópico de perda gestacional, toda a gente se sente desconfortável.
Até a pessoa que a sofreu.
Aquela, que se calhar não quer estar sozinha.
Que se calhar até fez um esforço sobre-humano para pedir ajuda.
Que ultrapassou todo o seu sofrimento e conseguiu emitir um pedido para ser ouvida, para ser abraçada.

E comecei a pensar: se eu tivesse uma amiga que me dissesse que precisava de falar, de partilhar comigo, qual seria o único tema que me deixaria desconfortável?
Se ela me dissesse que era uma serial killer.
Não me identifico com as necessidades de uma s.k.; não consigo compreender o motivo; não sei se seria capaz de ajudar. E sinceramente, até me assustaria um pouco porque me poderia acontecer algo só de estar com ela.
A mesma coisa se passa com as perdas gestacionais.
Ninguém quer passar por isso, ninguém quer imaginar passar por isso, porque ninguém sabe porque acontece, porque não se pode fazer nada para evitar que tenha acontecido ou que volte a acontecer. E intuitivamente, até assustaria um pouco porque acreditando na teoria do "The Secret", só o facto de pensar nisso e de falar nisso, pode atrair a coisa.

Não é preciso falar muito. É só ouvir.
Não é preciso telefonar. Basta um email ou uma sms com um beijo e, se se sentirem com coragem, a oferta de um cafézinho.
Ainda assim, não é preciso encontrarem-se. Mas por favor, então não digam que "depois ligam", ou que "estou aqui se precisares de  alguma coisa". Porque se a mãe precisar, se ela tiver a coragem e a energia para pedir o vosso apoio, vai-se sentir ainda mais abandonada quando verificar que afinal, eram só palavras vãs.
De certeza que ela gostaria que fizessem um esforço para estarem com ela (não para dizerem ou fazerem algo, mas simplesmente estar). Mas não sintam vergonha por não quererem ou poderem estar com a mãe. Sejam sinceros e em vez do silêncio, digam-lhe que neste momento não têm capacidade de o fazer e não sabem como ajudar e que têm medo de ainda piorar a situação.
Ela vai perceber.

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